Caso Tráfico de seres humanos

trafico seres humanos

// Autor: Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV)

 

Aos 20 anos de idade, Daree, uma rapariga natural da Tailândia, decidiu tentar encontrar trabalho noutro país, a fim de melhorar as suas condições de vida e ajudar a sua família. Quando estava à procura de trabalho através da internet, Daree conheceu Ricardo, um cidadão português de 35 anos, através de uma rede social. Ricardo disse à Daree que tinha uma empresa em Portugal e que estava à procura de uma pessoa para trabalhar como empregada de limpeza, a quem oferecia contrato de trabalho, um ordenado mensal de €1.000,00 (mil euros) e seguro de saúde. Daree interessou-se imediatamente e Ricardo comprometeu-se a tratar de toda a documentação e dos bilhetes aéreos para a sua vinda para Portugal. Daree nunca tinha saído da Tailândia e a vinda para Portugal implicou uma escala de 6 dias na China, durante a qual dormiu no aeroporto. Durante um destes dias, conheceu uma outra rapariga, Jane, também tailandesa, que estava a caminho de Espanha, onde realizaria um curso de mestrado. As duas raparigas ficaram amigas e trocaram contactos de telefone e email.
 
Quando Daree chegou a Portugal, Ricardo estava à sua espera no aeroporto. Após se apresentarem, Ricardo pediu a Daree que entregasse o seu passaporte, para que ele tratasse do seu contrato de trabalho, o que ela fez. Os dois entraram num carro e seguiram caminho.
 
Daree olhou com surpresa e agrado a cidade à sua volta, sentindo-se realizada por ter conseguido um bom trabalho e por poder ajudar a sua família. Tinha planos de terminar os seus estudos, aprender a língua portuguesa e, com o tempo, conseguir um trabalho qualificado.
 
Contudo, para o seu espanto, Daree não foi levada para a empresa de Ricardo, como este lhe prometera, mas sim para uma pequena quinta, numa zona isolada, onde funcionava uma casa de prostituição. Foi levada para um quarto, onde já estavam cinco raparigas, e Ricardo mandou-a vestir uma roupa justa e sapatos de salto alto. Ao início, Daree não estava a compreender o que havia acontecido, mas outra rapariga, que falava inglês, explicou que naquele local elas eram obrigadas a prostituir-se.
 
Assustada, Daree começou a gritar por socorro e então apareceu Ricardo, que lhe disse “Aqui tu farás tudo aquilo que eu ordenar! Com a tua viagem para Portugal foram gastos €10.000,00 e a cada dia que passas aqui são gastos €100,00 com a tua alimentação e hospedagem. Enquanto não me pagares, não podes ir embora. Tenho os teus documentos comigo e se tentares fugir, serás presa pela polícia. Eu também sei onde mora a tua família e, se não me obedeceres, eles pagarão com a própria vida!”.
 
Daquele momento em diante, começou o pesadelo de Daree. Ela era obrigada a atender de 10 a 15 homens por dia e todo o dinheiro que recebia era entregue a Ricardo. Não podia falar com os familiares e nem ir à rua. Com muita frequência, Ricardo agredia Daree e as outras raparigas, como forma de intimidá-la.
 
Passados 6 meses desde a sua chegada, Daree percebeu que um dos homens que frequentava a casa de alterne afeiçoou-se por si. Na altura do natal, Daree pediu-lhe um telemóvel. Com o aparelho em mãos, Daree começou a tirar fotografias dela própria e das outras raparigas que tinham marcas das agressões sofridas, bem como do local onde ficavam sequestradas, e enviá-las através de mensagem à Jane, que estava em Espanha. Algumas semanas depois, convenceu aquele mesmo cliente a dizer-lhe a morada exata da casa de prostituição onde estavam, e também transmitiu esta informação à amiga, através de mensagem.
 
Jane percebeu logo a gravidade da situação e já havia contactado a polícia em Portugal para transmitir as informações que ia recebendo e solicitar ajuda. Quando finalmente a morada da casa foi revelada, a Polícia Judiciária dirigiu-se ao local e conseguiu resgatar Daree e as outras vítimas, detendo Ricardo em flagrante.
 
De todas as vítimas, somente Daree concordou em testemunhar contra Ricardo, para além de Jane, que tinha todas as fotografias no seu telemóvel, fornecendo informações suficientes ao Ministério Público para acusar Ricardo pelo crime de tráfico de seres humanos. Durante o inquérito, Ricardo permaneceu em prisão preventiva e Daree foi colocada numa casa abrigo para vítimas de tráfico de seres humanos, onde recebeu apoio psicológico e aconselhamento sobre os seus direitos.
 

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